Porto Alegre 250 anos: história da devoção a Nossa Senhora de Belém

31/03/2022

Porto Alegre 250 anos: história da devoção a Nossa Senhora de Belém

A capital do Rio Grande do Sul celebrou no dia 26 de março de 2022 o seu aniversário de 250 anos de fundação. Os primeiros imigrantes desembarcaram trazendo consigo suas devoções, entre as quais a São Francisco das Chagas - primeiro padroeiro de Porto Alegre. Com o passar dos anos e a expansão da cidade, novas igrejas foram construídas para que o povo pudesse manifestar sua fé. 

 

Entre as paróquias mais antigas de Porto Alegre está Nossa Senhora de Belém, localizada atualmente no bairro Belém Novo, zona sul da Capital. Sua data de fundação é de 1880, sendo a segunda mais antiga da cidade, atrás apenas da catedral Mãe de Deus. A capela, localizada no bairro Belém Velho, permanece de pé. Um profundo conhecedor dos quase 200 anos de história da região é o marceneiro de profissão, mas pesquisador histórico e genealogista há mais de 25 anos, Cristiano Goulart, que resume uma parte da caminhada de quase dois séculos.

 

“A capela de Belém Velho foi construída em 1824. Em 1830 foram delimitados os limites da nova freguesia de Nossa Senhora de Belém, fazendo parte do distrito de Viamão - não de Porto Alegre. Em 1852 constroem uma igrejinha, que logo em seguida apresentou problemas. Por causa das dificuldades da época, estradas ruins para escoar suas produções , distância do centro e até a falta d'água, fez com que os moradores da freguesia remetessem um ofício ao presidente da província, pedindo a troca da freguesia para as margens do Guaíba a fim de facilitar a vida de todos. O período da Revolução Farroupilha (1835-1845) deixou a igreja de Belém Velho sem pároco e totalmente desassistida”, conta o historiador que tem uma íntima ligação com a região na Zona Sul de Porto Alegre. 

 

“Descendo do capitão mor e fundador da vila de Laguna (SC), Francisco de Brito Peixoto, iniciador do povoamento português dos campos de Viamão.  Segundo o Monsenhor Rubens Neis (1925-2003), minha octavó Ana da Guerra, filha de Francisco, juntamente com seus filhos, teria construído uma pequena capela, na região de lombas em Viamão (a primeira do RS), anterior a Nossa Senhora da Conceição de Viamão [da qual tenho parentes envolvidos] e a São Pedro em Rio Grande [a primeira oficial do RS] que o seu padrinho e idealizador foi o brigadeiro Rafael Pinto Bandeira , também meu parente”, relembra.

 

No ano de 1865, o cidadão Ignácio Antonio da Silva e sua esposa Anna Correia da Silveira, compram as terras da antiga fazenda Morrinho, que era de propriedade do capitão Joaquim Mariano Aranha e sua esposa Francisca Maria Soares - esta viúva de José Luiz Soares o primitivo proprietário da área -, o que é hoje o Belém Novo. Cristiano Goulart conta que seis anos depois a fazenda teve a desapropriação autorizada para que ocorresse a transferência da sede de Belém Velho para Belém Novo - onde está até hoje. 

 

A lei 764, de 04/05/1871 autorizou a desapropriação e a transferência da sede da freguesia Nossa Senhora de Belém. Pela lei 616 de 1867 o governo autorizou a procura de um lugar na área do arado velho, para a transferência,  dois anos após a compra das terras por Ignácio, que obviamente não concordou com a desapropriação de suas terras, começando um processo que durou 11 anos até a transferência definitiva.

 

O que acelerou a transferência é o desabamento da matriz de Belém Velho na madrugada de 22 de fevereiro de 1872 devido a um temporal. No dia 10 de julho de 1876, o casal Ignácio e Anna, resolveram fazer a doação das terras para a construção da nova igreja/sede , da freguesia, praça, cemitério e a casa do pároco. A mudança, contudo, também trouxe discordância entre os moradores da região. “Alguns fregueses de Belém Velho, não concordavam com a transferência e decidiram pela reconstrução da igreja desabada (parte) para tentar reverter a situação”, salienta Cristiano. 

 

A decisão de construir a nova matriz prevaleceu. É então nomeada a comissão de construção, composta por, Ignacio Antonio da Silva, doador, Manoel Antônio Fagundes, da Ponta Grossa, Luiz Belmiro da Silva Rosa, de Belém Velho e João Baptista de Magalhães, do Passo da Capivara - Ipanema , pai do Juca Batista - José Baptista de Magalhães.

 

A pedra fundamental da nova matriz foi lançada em 25 de setembro de 1876 com a construção iniciando em fevereiro de 1877. Três anos depois, em 1880, a capela mor e o cemitério são concluídos. No dia 14 de fevereiro daquele ano,  o ato do presidente da província, Dr Carlos Thompson Flores e a provisão eclesiástica de dom Sebastião Dias Laranjeira, efetiva a transferência de Belém Velho para a freguesia Nossa Senhora de Belém do Guahyba. No mês seguinte, o padre Ramão Rodrigues Fuentemayor Herze, benzeu solenemente a nova igreja e o cemitério. Em abril de 1880 são transferidas as imagens de Nossa Senhora de Belém, São José e do Espírito Santo, dando início a realização dos cultos na nova matriz.  

 

“Durante muitos anos , na época do aniversário da nova freguesia, a imagem de Belém Novo, passava um dia na matriz de Belém Velho, pratica que não acontece mais. Existe uma ‘história’ de que numa destas vezes, os fregueses de Belém velho, não queriam fazer a procissão de traslado da imagem de volta para Belém Novo, o que ocasionou uma "briga" entre os dois belens, fazendo com que Ignácio , seu filho Eustachio e demais moradores da região de Belém Novo, fossem a cavalo, em grande número buscar a referida imagem”, finaliza o historiador. 

 

O início da devoção

 

A devoção a Nossa Senhora de Belém no território de Porto Alegre tem uma história de mais de 200 anos, sendo anterior à própria construção da primeira capela e merece ser contada à parte. Tudo começou com o português Dionísio Rodrigues Mendes e sua esposa Beatriz Barbosa Rangel, que se estabeleceram nos campos da região. Com a morte do casal, as terras foram partilhadas, sendo que o filho, André Bernardes Rangel, comprando as partes dos demais irmãos, ficou de posse da área (mais ou menos) da Vila Nova até o Guaíba, do Arroio da Cavalhada até o arroio Guabiroba.

 

“Seu irmão mais velho, Manoel Rodrigues Rangel, e sua esposa, Francisca Maria de Jesus, ficam de posse da parte alta da sesmaria, estabelecidos nas proximidades da hoje praça de Belém Velho. Este casal não teve filhos, porém, adotaram um menino de nome Felisberto Rodrigues Barbosa. Com a morte de Manoel em 1816, sua viúva, devota de Nossa Senhora de Belém, começa a rezar o Terço em sua casa. A população do local frequentava este espaço, já que a igreja mais perto era no centro de Porto Alegre ou de Viamão. 

 

Com a morte de Francisca, a população da região seguiu a devoção a Nossa Senhora de Belém. Suas terras acabaram indo a leilão pois não tinham descendentes - mesmo tendo adotado Felisberto, por algum motivo não recebeu a herança de  seus pais -, sendo as terras arrematadas por Florêncio Braz Lopes e este doado uma parte a Nossa Senhora de Belém, tornando-se ele um dos incentivadores da criação de uma capela para a realização de cultos”, aponta o historiador Cristiano Goulart.


 

Nossa Senhora de Belém hoje

 

No ano de 2026 a paróquia Nossa Senhora de Belém completa 150 anos de sua fundação. Há seis anos iniciou um processo de reforma e revitalização de suas instalações. O investimento somado se aproxima dos R$ 600 mil até o momento. O  trabalho de revitalização tem continuidade com a reforma e decoração artística da nave central, forro, coro, aberturas, vitrais e porta corta vento. Para 2025 será instalado ar-condicionado Split e a finalização se dará com a reforma externa da torre.

 

Em janeiro de 2022 foi concluída e apresentada aos fiéis a reforma e decoração artística do teto da Igreja. O padre Tiago Escouto, pároco da Nossa Senhora de Belém, explicou como se deu esta etapa do trabalho. “Entre as inúmeras novidades sacras que poderão ser apreciadas no teto estão alguns elementos artísticos do passado que, por questões estruturais e de infiltrações, acabaram-se danificados e perdendo-se ao longo das últimas décadas. Além disso, todo um emolduramento neogótico no teto foi criado, enaltecendo o estilo arquitetônico e sacro do templo. Ressaltando o conjunto, foi instalado ainda um moderno sistema de iluminação em Led de Alta Potência.”

 

A revitalização da Paróquia já entregou para a comunidade a restauração da imagem do Sagrado Coração de Jesus, realizada pelo artista plástico Paulo Joaquim da Silva. No ano de 2020 foi concluída a reforma e decoração artística do presbitério. Etapas anteriores contemplaram os trabalhos de pintura externa da Igreja, reforma da sacristia, aquisição de crucifixo, reforma da parte interna da torre além da aquisição de um novo ambão, credência, sédia, e banquetas auxiliares.





Autor:
Marcos Koboldt

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