É TEMPO DE SER IGREJA, CAMINHAR JUNTOS, PARTICIPAR

16/10/2024

A Igreja Católica está vivenciando a sua 15ª Assembleia Sinodal Ordinária, com o tema: “Para uma Igreja Sinodal: comunhão, participação e missão”. Como não recordar da canção da Irmã Paulina, Maria Luiza Ricciardi, lançada em 1989, que fez parte de um trabalho que leva o título “Nova Evangelização”? Talvez já tenhamos cantado em alguma celebração eucarística ou encontro formativo. Chama-se “É tempo de ser Igreja”! Eis a letra:

 

Agora é tempo de ser Igreja,
Caminhar juntos, participar!

Somos povo escolhido
E na fronte assinalados
Com o nome do Senhor,
Que caminha ao nosso lado!

Somos povo em missão,
Já é tempo de partir,
É o Senhor quem nos envia,
Em seu nome a servir!

Somos povo, esperança,
Vamos juntos planejar,
Ser Igreja a serviço,
E a fé testemunhar!

Somos povo a caminho,
Construindo em mutirão
Nova terra, novo reino,
De fraterna comunhão!

 

Sim, somos povo escolhido, em missão, peregrinos de esperança, a caminho! As primeiras linhas das quatro estrofes já nos oferecem uma síntese do que é ser Igreja. Mas encontramos outros importantes elementos na canção, como o sacramento que nos torna membro da Igreja e nos dá a certeza de que Deus caminha conosco (1ª estrofe), ou a dimensão do serviço (2ª e 3ª estrofes), do planejamento em conjunto (3ª estrofe) e da comunhão (4ª estrofe). E o refrão resume tudo isso, recordando uma certa urgência e sendo uma espécie de convocação, como para uma assembleia: “Agora é tempo de ser Igreja, caminhar juntos, participar”.

 

Igreja, comunidade eclesial, assembleia de vocacionados e vocacionadas, Povo de Deus. Aberta, em saída, consciente de sua missão de evangelizar, levar a boa nova de Jesus, o Projeto de Deus, de semear a esperança e o amor, construir a paz e defender a vida. Esta aula deseja reforçar o compromisso de todos nós – cristãos leigos e leigas, pessoas de vida consagrada, ministros que receberam o sacramento da Ordem – para o serviço na messe, no mundo, como operários e operárias (cf. Mt 9,35-38; Lc 10,2).

 

E para melhor compreender a missão da Igreja, ou a nossa própria missão, podemos retomar a primeira Exortação Apostólica do Papa Francisco, com o título: “A Alegria do Evangelho” (Evangelii Gaudium). Foi divulgada pouco mais de oito meses após ele ter sido eleito Papa. Quem não se lembra do “Habemus Papam” escutado no dia 13 de março de 2013? A Evangelii Gaudium é de 24 de novembro daquele ano. Esta primeira Exortação faz recordar de outros documentos da Igreja. Interligando os textos e observando os contextos, melhor compreenderemos e assimilaremos a nossa missão eclesial, a nossa missão de ser Igreja, de caminhar juntos, participar!

 

Gaudium et Spes & Evangelii Gaudium

Dentre os 16 documentos do Concílio Ecumênico Vaticano II, realizado nos anos 1962 a 1965, temos uma Constituição Pastoral sobre a Igreja no mundo, com o título, “Alegrias e Esperanças” (Gaudium et Spes). Foi publicada no dia 07 de dezembro de 1965, praticamente na conclusão do Concílio, ou seja, há quase 60 anos! Pouco menos de 50 anos separa este documento da Evangelii Gaudium do papa Francisco...

 

Assim começa o documento Gaudium et Spes, de 1965: “As alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias, sobretudo dos pobres e dos sofredores, são também as dos discípulos de Cristo”. E assim começa a Exortação Evangelii Gaudium, de 2013: “A Alegria do Evangelho enche o coração e a vida inteira daqueles que se encontram com Jesus”.

 

Se na Gaudium et Spes, logo no primeiro parágrafo, lemos que a Igreja é formada por seres humanos, guiados pelo Espírito Santo para construir o Reino, comunicando a todos a boa nova de Jesus, na Exortação do Papa Francisco, Evangelii Gaudium, também no início, lemos que somos convidados para uma nova etapa evangelizadora, marcada pela alegria, e, para isso, é oferecida indicação de caminhos para a Igreja nos próximos anos. Compreender o projeto de Deus revelado por Jesus e descrito no Evangelho – amor, misericórdia, perdão, comunhão, paz, vida – produz em nosso coração um sentimento de alegria e esperança. Saber que esta boa nova deve ser levada a todos, num compromisso inerente ao fato de sermos todos membros da Igreja é a evangelização, ou a missão. É a nossa missão, de todos nós, realizada com alegria (gaudium)!

 

A Gaudium et Spes, em seu número 4, apresenta as rápidas transformações que se estendem a toda a terra, provocadas pela inteligência e atividade criadora do ser humano. Há riqueza, mas há, também, pobreza, fome, miséria, conflitos sociais, políticos, econômicos, ideológicos... Um texto que tem quase 60 anos, mas continua nos chamando atenção! Como neste parágrafo, tão atual: “A paz não é ausência de guerra; é chamada obra da justiça (Is 32,7). A paz nunca se alcança de uma vez por todas, mas deve ser constantemente edificada. É também fruto do amor, o qual vai além do que a justiça consegue alcançar” (cf. GS 78). O papa Francisco utiliza esta citação no seu texto de 2013 e complementa: “Uma paz que não surja como fruto do desenvolvimento integral de todos, não terá futuro e será sempre semente de novos conflitos e variadas formas de violência” (EG 219). E “para avançar nesta construção de um povo em paz, justiça e fraternidade”, indica alguns princípios oriundos da Doutrina Social da Igreja, como, por exemplo, saber privilegiar o processo e transformar conflitos em oportunidades, considerar o todo mais importante que a parte e buscar o diálogo (cf. EG 221-258). Vale a pena retomar essa reflexão e aprofundá-la nos encontros e reuniões, seja na catequese ou na nossa formação permanente.

 

Evangelii Nuntiandi & Evangelii Gaudium

 

Dez anos após a conclusão do Concílio Vaticano II, o papa da época, São Paulo VI, publicou a Exortação Evangelii Nuntiandi – “O Anúncio do Evangelho”. Era 08 de dezembro de 1975. E foi escrita logo após a 3ª Assembleia Sinodal Ordinária, cujo tema era justamente sobre a “Evangelização no mundo moderno” (1974). Vale recordar que o papa Francisco escreveu a Evangelii Gaudium em 2013 também como uma Exortação após a 13ª Assembleia Sinodal, realizada em 2012, ainda com o papa Bento XVI, com a temática: “A Nova Evangelização para a transmissão da Fé Cristã”

 

Assim começa o texto da Evangelii Nuntiandi, de São Paulo VI, de 1975: “O empenho em anunciar o Evangelho aos homens do nosso tempo, animados pela esperança, mas, ao mesmo tempo, torturados muitas vezes pelo medo e pela angústia, é, sem dúvida alguma, um serviço prestado à comunidade dos cristãos, bem como a toda a humanidade”. Uma Exortação que apresenta a temática da Evangelização, definições, conteúdo, caminhos, destinatários, responsáveis, espírito, e conclui com Maria, a estrela da evangelização: “Que seja ela a estrela da evangelização sempre renovada, que a Igreja, obediente ao mandato do Senhor, deve promover e realizar, sobretudo nestes tempos difíceis, mas cheios de esperança!” (EN 82). Interessante observar no parágrafo 17, na definição do que seja evangelizar, a necessária visão de conjunto de todos os elementos da evangelização para se evitar uma definição parcial e fragmentária. Tais elementos essenciais, afirma o Papa, foram tratados no Sínodo do ano anterior (1974), em concordância com o Concílio Vaticano II.

 

A Evangelii Gaudium de Francisco, 2013, cita a Evangelii Nuntiandi de Paulo VI, 1975, em 15 ocasiões. A mesma quantidade de vezes do “Documento de Aparecida”, a 5ª Conferência do Episcopado Latino-americano e Caribenho, evento realizado em 2007, onde o então Arcebispo de Buenos Aires, Cardeal Bergoglio, atuou como presidente da comissão de redação. Fica evidente a grande ligação entre estes documentos. De fato, o conceito de “discípulo missionário” praticamente nasceu ali naquela Conferência. E ganhou grande destaque na Evangelii Gaudium, no “coração” do documento, ou em seu eixo central, sobre o Anúncio do Evangelho (cf. EG 110-175). Vejamos o parágrafo 120:

 

“Em virtude do Batismo recebido, cada membro do povo de Deus tornou-se discípulo missionário (cf. Mt 28,19). Cada um dos batizados, independentemente da própria função na Igreja e do grau de instrução da sua fé, é um sujeito ativo de evangelização [...]. A nova evangelização deve implicar um novo protagonismo de cada um dos batizados. Esta convicção transforma-se num apelo dirigido a cada cristão para que ninguém renuncie ao seu compromisso de evangelização [...]. Cada cristão é missionário na medida em que se encontrou com o amor de Deus em Cristo Jesus; não digamos mais que somos «discípulos» e «missionários», mas sempre que somos «discípulos missionários». Se não estivermos convencidos disto, olhemos para os primeiros discípulos, que logo depois de terem conhecido o olhar de Jesus, saíram proclamando cheios de alegria: «Encontramos o Messias» (Jo 1,41). A Samaritana, logo que terminou o seu diálogo com Jesus, tornou-se missionária, e muitos samaritanos acreditaram em Jesus «devido às palavras da mulher» (Jo 4,39). Também São Paulo, depois do seu encontro com Jesus Cristo, «começou imediatamente a proclamar que Jesus era o Filho de Deus» (cf. At 9,20). Porque esperamos nós?” (grifo nosso).

 

Uma nova evangelização exige um novo protagonismo de cada um de nós! Mas a estrela continua a mesma: “Há um estilo mariano na atividade evangelizadora da Igreja”, afirma o papa Francisco no parágrafo conclusivo da Evangelii Gaudium. E é justamente com ela, a Estrela da nova evangelização, que desejamos concluir nossa reflexão sobre a Igreja em saída, não fechada em si mesma, sinodal, em comunhão, participação e missão:

 

“Ajudai-nos a refulgir com o testemunho da comunhão, do serviço, da fé ardente e generosa, da justiça e do amor aos pobres, para que a alegria do Evangelho chegue até aos confins da terra e nenhuma periferia fique privada da sua luz. Mãe do Evangelho vivente, manancial de alegria para os pequeninos, rogai por nós. Amém. Aleluia!” (EG 288).

 

 



Autor:
Dom Juarez Albino Destro

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